O agronegócio movimenta cifras milionárias no mercado nacional, necessitando da ampliação de créditos aos produtores rurais para fomentar a atividade agropecuária. Desse modo, com o aumento da procura de créditos pelos agricultores e diante da necessidade de ampliação do setor que mais cresce no País, instituições financeiras estão ampliando suas carteiras, com a concessão de inúmeras linhas de financiamentos. Surge, então, a necessidade de proteger o credor com garantias que lhe amparem em eventual inadimplemento da obrigação pelo produtor.
O crédito rural foi institucionalizado na década de 60, com a promulgação da Lei do Crédito Rural nº 4.829/95 criada para estimular o desenvolvimento do setor agrícola do Brasil, cuja lei ainda prevalece válida.
Em 1967, o Decreto-Lei 167/67 estabeleceu a criação dos instrumentos de crédito, Cédula Rural Pignoratícia (CRP). Cédula Rural Hipotecária (CRH), Cédula Rural Pignoratícia e Hipotecária (CRPH), nota de crédito rural, Nota Promissória Rural e Duplicata Rural, para regulamentar o crédito rural. De acordo com cada cédula, há a instituição de garantias, as quais, eram, em um primeiro momento, de penhor ou hipoteca.
Muito embora hajam outras modalidades de garantias, passa-se a análise da alienação fiduciária como forma de melhor amparo ao credor de operações rurais.
Nas palavras de Orlando Gomes, “a alienação fiduciária é o negócio jurídico pelo qual uma das partes adquire, em confiança, a propriedade de um bem, obrigando-se a devolvê-la quando (…) lhe seja pedida a restituição.”. Ou seja, representa a transmissão da propriedade ou de um direito ao fiduciário que se obriga a dar-lhe a devida destinação e, cumprido o encargo, devolve a coisa ou o direito ao fiduciante.
A alienação fiduciária sobre bens móveis e imóveis possui amparo nos arts. 1367 do Código Civil, 674, §1º, 799, I, 804, § 3º, 889, V do Código de Processo Civil, assim como na Lei de Alienação fiduciária.
Depreende-se, assim, que a alienação fiduciária é uma forma de ampliar a proteção do credor quando da concessão de créditos agrícolas, no qual, obtém a propriedade resolúvel de bens móveis e imóveis dos produtores rurais, resguardando de forma mais proeminente o crédito deferido.
Assim, o crédito com a garantia de alienação fiduciária é constituído e levado a efeito mediante registro na serventia competente. Não cumprida a obrigação pelo fiduciário, impõe-se a consolidação da propriedade sobre o bem ou coisa objeto da garantia fiduciária.
Analisando os institutos da hipoteca e da alienação fiduciária sobre bens imóveis é possível aferir que esta última representa maior benefício ao credor, que não precisará mais demandar judicialmente a reivindicação da garantia cedular por meio de ação de busca e apreensão, podendo fazê-la de forma administrativa como preceitua a lei vigente, contrariamente ao instituto da hipoteca, no qual o inadimplemento da obrigação acarreta a execução do título extrajudicial, com possibilidade de penhora sobre o bem objeto da garantia de hipoteca e, nem sempre é capaz de garantir o credor com a expropriação desse bem, como ocorre em casos em que a impenhorabilidade da garantia hipotecária vem declarada por ocasião da pequena propriedade rural.
Em contrapartida, essa modalidade de garantia aos produtores rurais representa medida mais árdua na medida em que poderá sofrer os efeitos da Lei de Alienação, com a perda do imóvel objeto da garantia. Do mesmo modo, nesta modalidade, o produtor não poderá se valer do mesmo imóvel como garantia para realizar mais de um financiamento, diferentemente do instituto da hipoteca que poderá ser concedida a tal título, ao mesmo credor, em diversos graus. Por fim, o risco de o produtor ter seu bem transferido ao fiduciante em caso de inadimplemento também se impera face a frustrações de safras, ficando a mercê da vontade do credor para não se valer do que a lei naquele momento lhe ampara.
Ao credor, portanto, verifica-se uma forma mais vantajosa de deferir um crédito mediante uma garantia de alienação fiduciária tendo em vista a celeridade e eficácia para a recuperação de seu crédito, face aos outros institutos, ressaltando que a mesma poderá ocorrer, inclusive sobre a produção de grãos ou semoventes.
Não obstante a maior efetividade de recuperação de crédito por meio de garantia de alienação fiduciária há de se salientar que em tempos onde há a possibilidade de produtores pleitearem a recuperação judicial, nos termos da Lei nº 11.101/2015, oportuno se mostra o credor atentar para melhores formas de proteção do seu crédito, salvaguardando-o.
Uma forma de afastar o crédito dos trâmites de uma recuperação judicial ou falência se dá por meio da constituição de créditos com garantia de alienação fiduciária, conforme estabelece o parágrafo terceiro do art. 49 da Lei 11.101/05.
Pairam, todavia, discussões nos tribunais superiores e na doutrina acerca do alcance dos efeitos da recuperação judicial nos créditos garantidos por alienação fiduciária, o que merece ser analisado e embasado de acordo com o caso em concreto, principalmente, no sentido de tutelar o direito do credor, que passa a condição de vulnerável ao tempo de uma recuperação judicial.
Portanto, impõe-se a necessidade de buscar-se o afastamento da exceção constante na parte final do §3º do art. 49 da LRF, a qual permite a manutenção na posse do devedor dos bens de capital essenciais a continuidade do negócio, por meio da existência de garantia de alienação fiduciária sobre produtos agrícolas.
Assim, sopesados superficialmente os pontos aqui referidos, depreende-se que a outorga de garantia por meio de alienação fiduciária representa uma forma de beneficiar e amparar o credor na concessão de um credito agropecuário, face as suas particularidades e peculiaridades.
Lei nº 4.829, de 5 de novembro de 1965. Institucionaliza o Crédito Rural.
Decreto-Lei nº 167, de 14 de fevereiro de 1967. Dispõe sobre títulos de crédito rural e dá outras providências.
Decreto-Lei 911, de 1º de outubro de 1969. Lei de Alienação Fiduciária.
Lei nº 10.406, 10 de janeiro de 2002, Institui o Código Civil Brasileiro.
Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. Institui o Código de Processo Civil.
Lei nº 9.514, de 20 de novembro de 1997. Dispõe sobre o Sistema de Financiamento Imobiliário, institui a alienação fiduciária de coisa imóvel e dá outras providências.
Rodrigues, Rafael Molinari.Alienação Fiduciária de Produtos Agropecuários no Agronegócio. São Paulo, 2015.
GOMES, Orlando. Alienação fiduciária em garantia. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1971.
Zambiazi. Penhor de grãos em CPR pode ser convertido em Alienação Fiduciária em Garantia, ficando fora dos efeitos da Recuperação Judicial, 2019. Disponível em:< https://www.zambiazi.com.br/article/10>. Acesso em 20.08.2020.
Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005. Regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária.